Notícias

Artigo-de-interesse.png

11 de julho de 2025 Artigos

O diagnóstico da esteato-hepatite associada à disfunção metabólica (MASH), condição inflamatória do espectro da doença hepática esteatótica associada à disfunção metabólica (MASLD), representa um desafio clínico relevante, considerando sua evolução potencial para fibrose avançada, cirrose e carcinoma hepatocelular. 

A definição diagnóstica de MASH exige a detecção concomitante de esteatose hepática, inflamação lobular, degeneração hepatocelular (ballooning) e, frequentemente, algum grau de fibrose. Para isso, a combinação de critérios clínicos, laboratoriais e exames de imagem é fundamental na prática clínica.

A avaliação diagnóstica inicia-se, classicamente, com a confirmação da presença de esteatose hepática, que pode ser realizada por meio de diferentes técnicas de imagem. A ultrassonografia abdominal é amplamente utilizada como método inicial devido à sua disponibilidade, custo reduzido e boa acurácia para esteatose moderada a severa. 

No entanto, sua sensibilidade é limitada em casos de esteatose leve (inferior a 20%) e em indivíduos com obesidade significativa. Diante disso, métodos mais sensíveis, como a elastografia transitória, têm sido incorporados na rotina clínica. Através da medida do Controlled Attenuation Parameter (CAP), a elastografia permite quantificar a gordura hepática com acurácia superior, além de fornecer, de forma simultânea, estimativas de rigidez hepática, úteis na avaliação de fibrose.

Outra modalidade em expansão é a elastografia por Shear Wave, incorporada aos equipamentos de ultrassonografia de alta resolução. Essa técnica oferece avaliação quantitativa da rigidez hepática com melhor resolução espacial quando comparada à elastografia transitória. 

Além da confirmação da esteatose, o diagnóstico de MASH exige a identificação da presença de inflamação hepatocelular e lesão estrutural. Atualmente, a única metodologia capaz de identificar diretamente os critérios histológicos de inflamação lobular e ballooning hepatocelular é a biópsia hepática, que permanece como padrão ouro. Por meio da análise histopatológica, é possível determinar não apenas a presença de esteatose e inflamação, mas também quantificar o grau de fibrose, definindo o estadiamento da doença. Apesar de seu valor diagnóstico, a biópsia apresenta limitações significativas, como seu caráter invasivo, risco de complicações (ainda que baixos, incluindo sangramento e dor) e possibilidade de erro amostral, uma vez que lesões hepáticas podem ser distribuídas de forma heterogênea.

Diante das limitações da biópsia, métodos não invasivos para estratificação da fibrose têm sido amplamente desenvolvidos e validados. Os principais são os escores clínicos baseados em dados laboratoriais e demográficos, entre os quais se destacam o FIB-4, que utiliza idade, AST, ALT e contagem de plaquetas, e o NAFLD Fibrosis Score, que incorpora também IMC, glicemia, albumina e presença de diabetes. Esses modelos apresentam elevada capacidade para excluir fibrose avançada (alto valor preditivo negativo), mas são menos sensíveis na detecção de estágios intermediários de fibrose.

Em paralelo, biomarcadores séricos compostos, como o ELF™ (Enhanced Liver Fibrosis Test), que combina ácido hialurônico, peptídeo terminal do procolágeno tipo III (PIIINP) e inibidor tecidual de metaloproteinase-1 (TIMP-1), têm demonstrado alta acurácia na identificação de fibrose significativa e avançada, sendo progressivamente incorporados em práticas clínicas de centros de referência. Outros painéis, como o FibroMeter® e o Hepascore, também têm papel relevante nesse contexto.

As técnicas de elastografia desempenham papel central na avaliação não invasiva da fibrose. A elastografia transitória (FibroScan®), além de estimar o grau de esteatose via CAP, mensura a rigidez hepática, que se correlaciona diretamente com o grau de fibrose. Valores de rigidez superiores a 8,0 kPa geralmente sugerem fibrose significativa (≥F2), enquanto valores acima de 12-14 kPa são altamente sugestivos de fibrose avançada ou cirrose. A elastografia por Shear Wave apresenta desempenho semelhante, com a vantagem de ser incorporada a ultrassons convencionais, permitindo avaliação simultânea de outros achados abdominais. Entre os métodos de imagem, a elastografia por ressonância magnética (MRE) é considerada a técnica não invasiva de maior acurácia atualmente disponível para detecção e estadiamento de fibrose, com sensibilidade e especificidade superiores a 90%, inclusive em pacientes com obesidade severa.

Adicionalmente, a avaliação dos critérios metabólicos é indispensável no diagnóstico de MASH, uma vez que a nova definição exige a presença de, no mínimo, um fator de risco cardiometabólico. A investigação inclui a mensuração de glicemia, hemoglobina glicada, perfil lipídico (HDL, LDL, triglicérides), pressão arterial, além de parâmetros antropométricos como IMC e circunferência abdominal. 

Em síntese, o diagnóstico da MASH é um processo que combina avaliação clínica criteriosa, aplicação de exames laboratoriais e utilização de métodos de imagem avançados. Embora a biópsia hepática permaneça como referência para a confirmação de inflamação e ballooning hepatocelular, os avanços nas técnicas não invasivas, especialmente na elastografia e nos biomarcadores séricos, têm permitido uma abordagem mais segura e eficiente na prática clínica. A definição de algoritmos diagnósticos integrados é essencial não apenas para a detecção precoce da MASH, mas também para estratificação de risco, monitoramento da progressão da doença e definição de elegibilidade para terapias emergentes.

Diante de uma prevalência global de 5,27%, com taxas particularmente elevadas na América Latina (7,11%) e no Brasil (30% a 35% da população adulta com MASLD, com risco significativo de progressão para MASH), torna-se imperativo que os profissionais de saúde estejam atentos aos critérios diagnósticos e utilizem de forma adequada os métodos disponíveis.

A incorporação de ferramentas não invasivas, como elastografia e biomarcadores séricos, associada à avaliação criteriosa dos fatores metabólicos, permite um diagnóstico mais preciso e seguro, reduzindo a dependência da biópsia hepática e possibilitando a intervenção precoce. Essa abordagem integrada é essencial para mitigar a progressão da doença e suas complicações, promovendo melhor qualidade de vida e reduzindo o impacto econômico e social associado à MASH.

Referência: Rinella ME et al. Hepatology. 2023;77:1797–1835

Você já conhece o MASH Map? Estamos mapeando locais que fazem elastografia no país

Veja mais artigos sobre Hepatologia


Artigo-de-interesse.png

2 de julho de 2025 Artigos

A esteatose hepática, anteriormente denominada Doença Hepática Gordurosa Não Alcoólica (NAFLD), representa hoje a principal causa de doença hepática crônica no mundo. Esta condição, entendida como a manifestação hepática da síndrome metabólica, reflete diretamente o crescimento global da obesidade, do diabetes tipo 2 e de outras disfunções metabólicas.

Dentro desse espectro, o termo Esteato-hepatite Não Alcoólica (NASH) foi historicamente adotado para descrever a forma mais avançada da doença — caracterizada por inflamação hepática, lesão hepatocelular e risco elevado de progressão para fibrose, cirrose e carcinoma hepatocelular.

No entanto, avanços no entendimento da fisiopatologia da doença, somados à necessidade de uma abordagem mais precisa, inclusiva e livre de estigmas, motivaram uma ampla revisão dos critérios diagnósticos e da nomenclatura. Esse processo foi conduzido por um consenso internacional liderado pelas principais sociedades hepatológicas — AASLD, EASL e ALEH —, reunindo especialistas de 56 países, além de representantes de sociedades médicas, órgãos regulatórios e associações de pacientes.

O resultado desse consenso é a adoção da nova terminologia: MASH (Metabolic dysfunction–Associated Steatohepatitis), inserida no espectro de MASLD (Metabolic dysfunction–Associated Steatotic Liver Disease). Essa mudança reflete não apenas uma atualização semântica, mas um realinhamento conceitual, centrado nos mecanismos fisiopatológicos da doença.

Por que a mudança era necessária?

A nomenclatura anterior, baseada em termos como “não alcoólica” e “gordurosa”, apresentava limitações relevantes. Além de ser construída por exclusão — exigindo descartar o consumo significativo de álcool e outras causas de doença hepática —, ela não refletia adequadamente os determinantes biológicos da condição.

Mais do que uma imprecisão científica, esses termos carregavam um peso estigmatizante para os pacientes. Estudos demonstraram que a expressão “gordurosa” e a referência ao álcool, mesmo em contexto de negação, geravam desconforto e prejudicavam tanto a comunicação médico-paciente quanto a adesão aos cuidados.

Além disso, a definição excludente desconsiderava a sobreposição entre disfunções metabólicas e outras etiologias hepáticas, como o consumo moderado de álcool — uma realidade clínica frequentemente observada.

Diante desse cenário, o novo modelo propõe uma definição afirmativa, centrada na disfunção metabólica como eixo fundamental da doença hepática associada à esteatose.

Critérios Diagnósticos: uma abordagem centrada na fisiopatologia

No modelo atual, o diagnóstico de MASLD se estabelece pela presença de esteatose hepática, associada a pelo menos um dos seguintes critérios de risco cardiometabólico:

  • Obesidade (definida por IMC elevado ou aumento da circunferência abdominal);
  • Diabetes mellitus tipo 2 ou pré-diabetes;
  • Hipertensão arterial sistêmica;
  • Dislipidemia (triglicerídeos elevados ou colesterol HDL reduzido);
  • Outros marcadores de resistência insulínica.

A partir desse enquadramento, a evolução da esteatose para um quadro inflamatório, com lesão hepatocelular e risco de progressão para fibrose, define o diagnóstico de MASH. A manutenção do termo steatohepatitis é fundamental do ponto de vista científico, pois garante a continuidade dos critérios histológicos utilizados até então — presença de esteatose, inflamação lobular e degeneração hepatocelular (ballooning). Isso permite não apenas a preservação da comparabilidade com estudos e registros anteriores, como também assegura a consistência no desenvolvimento e validação de biomarcadores e terapias.

Implicações clínicas e científicas da nova nomenclatura

A adoção de MASLD e MASH traz benefícios diretos para a prática clínica e para a pesquisa. Sob o ponto de vista clínico, o modelo afirmativo permite maior alinhamento com as abordagens já adotadas em outras especialidades, como endocrinologia e cardiologia, onde a síndrome metabólica é um eixo central de cuidado.

Além de reduzir o estigma associado aos termos anteriores, a nova nomenclatura melhora a comunicação entre profissionais de saúde e pacientes e facilita o rastreamento precoce dos indivíduos em risco, promovendo uma abordagem integrada e multidisciplinar.

No campo científico, essa atualização fortalece a estratificação de risco, aprimora os critérios de inclusão em ensaios clínicos e orienta o desenvolvimento de terapias mais direcionadas, alinhadas à fisiopatologia da doença.

Considerações finais

A transição de NAFLD para MASLD e de NASH para MASH representa muito mais que uma simples atualização de nomenclatura. Trata-se de uma mudança paradigmática que reflete o entendimento contemporâneo da doença hepática associada à esteatose — uma condição de natureza metabólica, sistêmica e com alto impacto na saúde pública global.

Ao adotar critérios diagnósticos afirmativos, centrados na disfunção metabólica, o novo modelo não apenas aprimora a acurácia clínica, mas também contribui para reduzir barreiras no cuidado, aumentar a efetividade das intervenções e estimular uma prática médica mais precisa, ética e centrada no paciente.

Referência: Rinella ME et al. Hepatology. 2023;77:1797–1835

Você já conhece o MASH Map? Estamos mapeando locais que fazem elastografia no país

Veja mais artigos sobre Hepatologia


Captura-de-tela-2025-06-18-081303.png

25 de junho de 2025 NotíciasServiços

A Sociedade Brasileira de Hepatologia (SBH) está disponilizando a seus sócios e ao público em geral um mapa de clínicas que realizam exames de elastografia hepática no Brasil. É o MASH Map, atualizado de maneira colaborativa com aprovação de uma equipe técnica e, inicialmente, disponível apenas para algumas cidades. Este mapa foi desenvolvido em parceria com a Novo Nordisk. *

(*) Não encontrou uma unidade próxima? Fique tranquilo! Novas localidades serão adicionadas em breve.

Para sugerir novos locais como pontos de realização de exame de elastografia, clique aqui


Dr. Carlos Terra
Presidente Gestão 2024-2025

(11) 99235-5763
[email protected]
Av. Brigadeiro Faria Lima, 2391 cj. 102 | São Paulo – SP – CEP 01452-000

Redes Sociais

Todos os direitos reservados © 2022 - Sociedade Brasileira de Hepatologia

Fale com a SBH: